Quarta-Feira, 27 de novembro de 2024
Quarta-Feira, 27 de novembro de 2024
O número geral de assassinatos continua em queda no Brasil em 2023, segundo o índice nacional de homicídios criado pelo g1, com base nos dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal.
Foram 19,7 mil assassinatos nos seis primeiros meses deste ano, o que representa uma queda de 3,4% em relação ao mesmo período do ano passado. O estado que registrou a maior baixa foi Roraima, com 22,5%.
Na contramão da tendência do país, dez estados tiveram altas nas mortes violentas: AC, AL, AP, ES, MA, MG, RJ, RS, SC e TO. O Amapá é, disparado, o estado com maior aumento: 65,1%.
Os dados não incluem as mortes decorrentes de violência policial (leia mais sobre a metodologia no final desta reportagem). São contabilizadas no levantamento as vítimas dos seguintes crimes:
Em 2022, o Brasil teve uma queda de 1% no número de assassinatos, como apontou o levantamento exclusivo do Monitor da Violência. Foram 40,8 mil mortes violentas intencionais no país no ano passado, o menor número de toda a série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública pelo segundo ano seguido.
Segundo especialistas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV-USP), embora a redução destes indicadores seja notícia que merece ser comemorada, seguimos como um país extremamente violento. Em média, foram quase 110 assassinatos por dia no último semestre.
"As taxas continuam elevadas, mas caso a redução se mantenha e a letalidade policial não cresça, o país pode fechar o ano com a menor quantidade de mortes intencionais violentas desde 2011", aponta Bruno Paes Manso, jornalista e pesquisador do NEV-USP.
A queda gradual dos números pode ser explicada por um conjunto de fatores, incluindo: mudanças na dinâmica do mercado de drogas brasileiro; apaziguamento de conflitos entre facções e políticas públicas de segurança e sociais.
"A redução acumulada nos últimos cinco anos em diversos estados brasileiros pode indicar uma relativa estabilidade nas posições de poder das gangues regionais em seus territórios, que vem se assentando depois das disputas acirradas da última década", diz Paes Manso.
Os dados do primeiro semestre de 2023 apontam que:
O levantamento, que compila os dados mês a mês, faz parte do Monitor da Violência, uma parceria do g1 com o NEV-USP e o FBSP.
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Idoso morre em leito de hospital após ser atingido por bala perdida em Vitória (ES), em junho de 2023 — Foto: Reprodução/TV Gazeta
Os dados apontam que todas as regiões do país tiveram queda nos assassinatos — com exceção do Sudeste. Foram 5.099 assassinatos no Sudeste no primeiro semestre deste ano — 212 mortes a mais que no mesmo período de 2022. O número representa aumento de 4,3%.
"É cedo para tecer afirmações definitivas, mas o fato de o Sudeste ser a única região que esteja indo na contramão da média nacional de queda nos crimes violentos letais intencionais sugere a necessidade de novos estudos acerca das realidades subnacionais", aponta a análise de Samira Bueno e Renato Sérgio de Lima, diretores do FBSP.
Na região, apenas São Paulo teve queda de 5,2%, revertendo a tendência de alta que havia sido observada no primeiro trimestre.
Já o estado que mais chama atenção é o Rio de Janeiro, que registrou alta de 17,3% nas mortes violentas intencionais. Na sequência vem Espírito Santo, com alta de 5% (veja no mapa abaixo).
O número de mortes violentas pode ser ainda maior, já que este balanço não leva em consideração as pessoas que foram mortas pela polícia.
A última edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, com dados de 2022, mostrou que o Rio de Janeiro é um dos estados com o maior número de mortes decorrentes de intervenção policial.
"O Rio de Janeiro parece que entrou em um novo ciclo de recrudescimento da violência, no eterno pêndulo que marca a área no estado. E isso estaria ocorrendo em razão, segundo pesquisadores locais, da morte do Ecko, chefe da maior milícia do Rio de Janeiro, em junho de 2021", diz o FBSP.
"A morte de Ecko desestabilizou acordos e relações entre organizações criminosas (facções e milícias), resultando em acertos de contas e novas disputas baseadas em muita violência, muito concentradas na capital, que puxa a tendência de alta no semestre."
Foto de arquivo de vidro de janela atingido por bala perdida no Rio de Janeiro. — Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Além do Sudeste como um todo, outros estados também foram na contramão da tendência nacional e tiveram aumento de violência no primeiro semestre.
O Amapá, por exemplo, teve a maior alta do país: 65,1%. O número de mortes passou de 106 para 175 no período. No primeiro semestre de 2022, o estado havia sido um destaque positivo, com redução das mortes.
Os números foram particularmente altos no estado em janeiro e fevereiro. Em janeiro, por exemplo, foram 40 mortes violentas — sendo que, em janeiro do ano passado, foram apenas 19.
A região Metropolitana de Macapá chegou a registrar cinco assassinatos em apenas três horas. O próprio governo afirmou que os crimes foram resultados de uma guerra entre duas facções que se dividiram no início do ano e passaram a disputar pontos de tráfico de droga.
"A gente sabe que são crimes encomendados, são direcionados, são execuções mesmo, briga por espaço, briga por pontos de tráfico de drogas", disse na ocasião o então secretário interino da Secretaria de Estado da Justiça e Segurança Pública, José Mont'Alverne.
A violência apenas voltou a um patamar mais próximo ao do ano passado em março, quando foram registrados 19 assassinatos (foram 14 em 2022).
"Este crescimento acentuado dos assassinatos parece estar relacionado a um conflito entre facções locais que se iniciou em outubro do ano passado, após o homicídio de uma liderança de uma das facções criminosas no município de Santana. Desde março, no entanto, o ritmo do crescimento da violência se alterou, indicando o estancamento da crise e o fato de que as forças de segurança estão atuando de modo mais articulado e coordenado", afirma o FBSP.
Mesmo com os aumentos de violência em alguns estados, a queda no primeiro semestre de 2023 aponta que o país está seguindo a mesma tendência nacional de 2022 e dos últimos anos, de diminuição gradual dos indicadores.
Os especialistas do Núcleo de Estudos da Violência da USP e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública elencam alguns pontos para explicar a queda dos indicadores nos últimos anos:
A ferramenta criada pelo g1 permite o acompanhamento dos dados de vítimas de crimes violentos mês a mês no país. Estão contabilizadas as vítimas de homicídios dolosos (incluindo os feminicídios), latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Juntos, estes casos compõem os chamados crimes violentos letais e intencionais.
Jornalistas do g1 espalhados pelo país solicitam os dados, via assessoria de imprensa e via Lei de Acesso à Informação, seguindo o padrão metodológico utilizado pelo fórum no Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Os dados coletados pelo g1 não incluem as mortes em decorrência de intervenção policial. Isso porque há uma dificuldade maior em obter esses dados em tempo real e de forma sistemática com os governos estaduais. O balanço fechado do ano de 2022 foi publicado em maio.
* Com Geisy Negreiros (g1 AC), Cau Rodrigues (g1 AL), Núbia Pacheco (g1 AP), Eliena Monteiro (g1 AM), Itana Alencar (g1 BA), André Teixeira (g1 CE), Pedro Alves Neto (g1 DF), Álvaro Guaresqui e Vitor Ferri (g1 ES), Michel Gomes (g1 GO), Rafaelle Fróes (g1 MA), José Câmara, Rafaela Moreira, Renata Barros, Thais Libni e Débora Teixeira (g1 MS), Kessillen Lopes (g1 MT), Raquel Freitas e Rafaela Mansur (g1 MG), Taymã Carneiro (g1 PA), Dani Fechine (g1 PB), Caio Budel (g1 PR), Bruno Marinho, Luiza Mendonça e Pedro Alves (g1 PE), Maria Romero (g1 PI), Fernanda Zauli e Igor Jácome (g1 RN), Gabriela Clemente e Lilian Lima (g1 RS), Jonatas Boni (g1 RO), Samantha Rufino e Valéria Oliveira (g1 RR), Caroline Borges (g1 SC), Joelma Gonçalves (g1 SE), Vilma Nascimento e Patrício Reis (g1 TO).