Sábado, 23 de novembro de 2024
Sábado, 23 de novembro de 2024
Com votação prevista para esta semana, a reforma tributária ainda está longe de consenso. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), convocou uma sessão extraordinária da Casa hoje, a fim de iniciar a votação de três medidas econômicas cruciais para o governo federal, entre elas o novo regime tributário. No entanto, enquanto o Congresso concentra esforços, governadores engrossam o coro de críticas e tentam barrar o texto.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), está em meio a uma mobilização junto a deputados estaduais e federais do estado na tentativa de adiar a votação. Na última sexta-feira, ele se reuniu no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo local, com o coordenador da bancada paulista na Câmara, deputado federal Antônio Carlos Rodrigues (PL), com o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), André do Prado (PL), e com o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), para discutir o tema.
Também participaram do encontro empresários e entidades que representam o setor de serviços, um dos maiores críticos ao texto da reforma. A ideia do governador é formar um bloco de pressão contra Lira e o relator da reforma na Casa, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), para postergar a apreciação do texto.
Tarcísio de Freitas tem enfatizado que não é contra a reforma e que concorda com outros aspectos da proposta que, no passado, foram objeto de contestação por parte da administração paulista. O principal deles é a mudança na cobrança do imposto de origem (onde o bem ou serviço é produzido) para o destino (onde é consumido).
O estado de São Paulo agora tem unido esforços contra a criação do Conselho Federativo, colegiado que vai gerir o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), imposto a ser criado pela reforma para substituir o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é um tributo estadual, e o Imposto sobre Serviços (ISS), tributo municipal. O governo teme perder autonomia na gestão dos recursos com o IBS.
Outros estados também já se colocaram contra o colegiado, como o Rio de Janeiro. O governador Cláudio Castro (PL) subiu o tom contra a reforma e afirmou que a instalação de um Conselho fere o pacto federativo e criticou a indefinição sobre as alíquotas propostas pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) — que serão decididas posteriormente.
"Como se fala de um IVA e não se fala da alíquota? Não deixaremos essa discussão passar sem alíquota", disse durante o 22º Fórum Econômico, organizado pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide). "O Rio de Janeiro não aceita votar a reforma sem uma clareza sobre isso. Sem saber efetivamente a alíquota, não tem votação", ressaltou.
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), que também esteve no Fórum Econômico, declarou que não se elegeu para "receber mesada" da União e afirmou que não irá abrir mão da autonomia estadual com a criação de um Conselho: "É aviltante imaginar que o cidadão eleito com a prerrogativa de governador e de prefeito fique amanhã a depender do que um Conselho Federativo vai dizer do que ele pode fazer no seu estado ou no seu município."
Um dos maiores críticos da reforma, Caiado se comprometeu a destinar sua agenda nesta semana a reuniões com deputados federais e lideranças. O governador chegou a convocar empresários e parlamentares do estado a virem à Brasília para um ato na Câmara dos Deputados nos próximos dias. O objetivo é convencer de que a reforma apresenta risco para a arrecadação de estados, municípios e para o pacto federativo.
Contraproposta
O relator da reforma na Câmara foi informado de que São Paulo pretende apresentar uma contraproposta para a criação do Conselho Federativo nesta semana e que não tem intenção de obstruir o projeto. O secretário da Fazenda paulista, Samuel Kinoshita, defende a criação de uma câmara de compensação, pela qual os estados compensariam uns aos outros ao fim do dia por operações que transbordam os limites de cada unidade da Federação.
Tributaristas temem que a solução se complique ao considerar os mais de 5,5 mil municípios, que também farão parte da reforma e terão a gestão da arrecadação compartilhada no Conselho Federativo. Existe a preocupação de que outros estados também fiquem dependentes de São Paulo caso a contraproposta seja aceita e a câmara de compensação fique responsável pelo repasse dos recursos arrecadados.
Na avaliação de especialistas, ainda "falta um olhar municipalista" na reforma. O presidente da Federação Nacional dos Auditores e Fiscais de Tributos Municipais (Fenafim), Fábio Macedo, realizou um estudo sobre as perdas em virtude da partilha de receitas do IBS para os municípios e apontou: "Quem mais sente os benefícios fiscais são os municípios, se criando novo tributo partilhado entre estados e municípios, haverá perdas para os municípios. Falta coerência", afirmou.
Segundo Macedo, caso o texto seja aprovado como está, os prefeitos correm o risco de conviver com longos períodos de receita estacionada, o que impacta na prestação de serviços públicos municipais. "O trabalhador mora no município. Essa reforma precisa ter um olhar municipalista e não está tendo. Dizem que os municípios vão ganhar, eu não acredito nisso, porque se o município tem o ISS, que é o setor econômico que mais cresce, ele vai perder participação em favor dos estados", disse.
O presidente da Federação apontou que os critérios de divisão do novo imposto devem prejudicar a gestão dos prefeitos. "Se não tiver um olhar municipalista, veremos cidades grandes, médias e pequenas em crise. Crise na coleta de lixo, crise na saúde, crise nas escolas, e será uma crise difícil de superar. As demandas dos municípios só fazem crescer e eu não vejo essa preocupação municipalista. Se a reforma passar desse jeito eu temo por nós que somos cidadãos e vivemos nas cidades", ressaltou.
*Correio Braziliense