Terça-Feira, 26 de novembro de 2024
Terça-Feira, 26 de novembro de 2024
Desde o início da tragédia que assola o Rio Grande do Sul, especialistas têm comparado as atuais inundações às cheias de 1941 no Guaíba, em Porto Alegre. Já se sabe que o desastre atual foi mais avassalador do que o anterior – o nível do lago bateu o antigo recorde de 4,76 metros e chegou nesta semana a 5,33 metros (para se ter uma ideia, ocorrem enchentes a partir de 3 metros).
Mas um levantamento da Rhama Analysis (empresa de engenharia com ênfase em recursos hídricos), divulgado nesta sexta-feira (10) ao g1, revela com mais precisão um dos elementos-chave para entender a maior gravidade em 2024: a intensidade e a distribuição das chuvas.
Em 1941, o nível do Guaíba levou 10 dias para saltar de 1,16 metro para a marca histórica de 4,76 metros.
Desta vez, em 2024, mesmo com a presença das comportas, que só foram construídas na década de 1970, foram necessários apenas 6 dias para o nível do lago sair de 1,24 metro e chegar aos impressionantes 5,33 metros.
Em 1941, as precipitações foram mais persistentes e atingiram Porto Alegre por cerca de 12 dias, mas com volumes diários mais baixos.
Em 2024, a tempestade teve maior intensidade (acumulados médios diários mais altos) e ficou concentrada em cerca de 4 dias seguidos.
“Um dos efeitos da mudança climática é justamente este: ter chuvas mais intensas e em duração menor. O que aconteceu agora foi um sinal muito claro disso”, afirma Carlos Eduardo Morelli Tucci, professor emérito do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IPH-UFRGS) e diretor de hidrologia da Rhama Analysis.
E a consequência prática dessa mudança é sentida pela população: quanto mais “de supetão” ocorre a inundação (com chuvas fortes e concentradas em poucos dias), menos tempo a Defesa Civil terá para comunicar quem está em área de risco e seguir um eventual plano de contingência.
“As previsões do tempo vão ter de ser cada vez mais assertivas e rápidas, para dar tempo de mitigar os danos. É preciso considerar não só as questões meteorológicas, mas também as climáticas e os modelos hidrológicos e hidrodinâmicos [que avaliam a velocidade e a vazão dos rios, por exemplo]", afirma Benício Monte, coordenador de projetos da Rhama e doutor em hidrologia.
Bruno Bainy, meteorologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que, analisando um contexto geral de mudanças climáticas, a região Sul do Brasil tenderá a apresentar um acumulado anual de chuva cada vez maior.
“Para uma elevação de temperatura média global de 2ºC ou mais, a expectativa é que o máximo acumulado de chuvas em um período de 5 dias seguidos passe a ser 15% maior”, afirma.
Ele deixa claro, no entanto, que não é apenas o fator “precipitação” que determina se haverá novas inundações: tudo dependerá do vento e de características geográficas locais. E acrescenta também que é preciso fazer um estudo de simulação computacional da atmosfera para entender qual o grau de interferência das mudanças climáticas nas tragédias atuais do RS.
“Há também influência do El Niño, por exemplo”, diz Bainy, referindo-se ao fenômeno natural que causa aquecimento das águas superficiais do Oceano Pacífico e leva mais chuvas ao Sul.
*g1