Quarta-Feira, 13 de agosto de 2025
Quarta-Feira, 13 de agosto de 2025
PIB dos EUA foi 60% superior em 2024, enquanto ritmo crescimento da China se mantém mais robusto por conta do forte incentivo estatal. Especialista ouvido pelo g1 analisa principais dados econômicos.
Os Estados Unidos e a China tentam consolidar o acordo comercial firmado em maio, em Genebra, que reduziu parte das tarifas sobre importações entre os dois países. Novas reuniões realizadas nesta semana, em Londres, indicam que a trégua seguirá de pé — embora não se saiba por quanto tempo.
Os termos do consenso ainda precisam da aprovação oficial dos presidentes Trump e Xi Jinping. Enquanto isso, economistas, empresários e investidores do mundo inteiro seguem atentos aos próximos passos da guerra tarifária e seus impactos para EUA, China e o resto do planeta.
Roberto Dumas, professor de economia chinesa do Insper, explica que essa matemática não é tão simples assim. Apesar de o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA ter sido 60% superior ao da China em 2024, indicadores evidenciam características e desafios distintos para os dois países.
Ao mesmo tempo, não há um vencedor na guerra comercial: o cenário, neste caso, é prejudicial para ambos, diz ele.
Compare, nesta reportagem, a economia dos dois países com base nos indicadores abaixo:
EUA x China: PIB em valores correntes — Foto: Arte/g1
?? A economia norte-americana é considerada mais "balanceada", por não ser totalmente voltada a investimentos, explica o professor Dumas. Além disso, tem maior foco em consumo do que em exportação, diante de um mercado interno aquecido.
?? Enquanto isso, a economia da China é mais direcionada a investimentos e exportações. Um dos principais fatores é o baixo percentual de consumo interno. Mas isso não significa que o chinês consome pouco: ele "produz demais, 'ao quadrado'", explica o professor.
Dumas explica que a solidez do crescimento econômico chinês também é explicado pelo regime ditatorial do país. Ao adotar um "capitalismo de Estado", o governo não precisa de fôlego político para implementar suas medidas.
Dessa forma, adota ações diretas para garantir o crescimento e, assim, evitar tensões sociais e desemprego, que poderiam ameaçar a estabilidade política do regime, diz o professor. Além disso, faz planejamentos de longo prazo.
"Para continuar crescendo, o país começou a aumentar a produção de bens industriais, incluindo baterias, painéis solares e carros elétricos. Por isso, nós vemos uma inundação de carros elétricos chineses", exemplifica.
EUA x China: PIB per capita — Foto: Arte/g1
A forte diferença histórica entre os países reflete, principalmente, a matemática populacional. Como a China tem 1,4 bilhão de habitantes, o PIB total é dividido por uma população muito maior, o que naturalmente leva o PIB per capita a um patamar muito mais baixo em comparação com os EUA.
Dumas, do Insper, diz também que os EUA têm crescido muito mais por "inspiração" (produtividade e qualidade do trabalho). Já a China, por "transpiração" (maior quantidade de trabalho e mão de obra).
Ou seja, o nível de produtividade norte-americano é maior, embora a massa trabalhadora chinesa seja superior. "Agora, a China está mudando, e sabe que precisa crescer via 'inspiração', via produtividade", acrescenta.
EUA x China: população — Foto: Arte/g1
Diante do crescimento acelerado da população, a China implementou, em 1979, a política do filho único. Nela, o governo deixou de garantir assistência social para o segundo e terceiro filhos, com o intuito de desestimular a natalidade.
Essa política mudou recentemente, nos anos 2010, explica o professor Dumas, do Insper. Desde então, é permitido ter até três filhos com acesso a benefícios do governo. A mudança ocorreu diante do envelhecimento da população e necessidade de mão de obra.
Os EUA, por outro lado, não enfrentam o mesmo desafio populacional. Apesar de existir preocupação com a sustentabilidade da Previdência, esse problema é muito mais latente na China.
EUA x China: taxa de desemprego — Foto: Arte/g1
O professor Roberto Dumas, do Insper, explica que, embora as taxas pareçam semelhantes, o governo chinês considera apenas a população urbana em sua contagem. Ou seja, ao excluir os moradores das áreas rurais, a taxa de desemprego no país tende a ser muito maior do que indicam os dados oficiais.
Além disso, o governo adota um forte incentivo para manter o nível de emprego elevado. Essa postura está ligada ao regime político e ao chamado "capitalismo de Estado". “O país precisa continuar crescendo. Caso contrário, pode haver tensões sociais”, afirma.
Nos EUA, o cenário atual é de pleno emprego, com vagas mais qualificadas e estáveis. Assim, em comparação com a China, os empregos representam condições mais vantajosas, com redes de proteção social, assistência médica e Previdência mais amplas.
Por outro lado, a menor intervenção estatal nos EUA tende a deixar a taxa mais suscetível a oscilações.
EUA x China: inflação — Foto: Arte/g1
Nos EUA, o Federal Reserve (Fed, o banco central do país) enfrenta desafios para convergir a taxa para a meta de 2% ao ano. Nesse sentido, as tarifas de Trump criaram novas incertezas para a política monetária do país.
Na China, a inflação praticamente nula reflete o baixo nível de consumo interno, além da crise no setor imobiliário. O índice de preços chinês resistiu, inclusive, aos efeitos da pandemia de Covid-19 — período em que a taxa norte-americana disparou a 8%.
O receio dos chineses de gastar, diz o professor, tem relação também com a baixa cobertura assistencial. Assim, eles optam por poupar, reduzindo a demanda e, consequentemente, os preços. Esse movimento eleva os temores de um cenário de deflação e desaceleração da atividade.
EUA x China: balança comercial — Foto: Arte/g1
Um dos objetivos de Donald Trump com as tarifas (mesmo que a eficácia seja questionada por economistas) é justamente reduzir o déficit comercial, especialmente com países com os quais os EUA têm maior desequilíbrio, como a China.
De modo geral, os norte-americanos gastam mais com importações do que arrecadam com importações.
Já para a China, o cenário é o contrário: o gigante asiático mais vende para outros países do que compra. E esse resultado tem relação direta com os dados econômicos já vistos nesta reportagem.
"Como o consumo interno é proporcionalmente baixo e o investimento e a produção são muito elevados, os chineses têm que vender o excedente para o exterior", sintetiza Dumas, do Insper, explicando que nos EUA o cenário é exatamente o contrário.
Segundo ele, portanto, as tarifas de Trump são ineficazes para resolver o problema da balança comercial norte-americana. Além disso, não há vencedor na guerra comercial. Como "você precisa de dois para dançar", a escalada de embates pode representar "um tiro no pé", finaliza o professor.
Veja um resumo dos dados no infográfico abaixo:
EUA x China: raio-x das duas maiores economias do planeta — Foto: Arte/g1
*G1