Péricles gosta de falar de amor. O tema é um dos que fazem parte do novo trabalho do cantor de 54 anos, o álbum Calendário, que chega em outubro com faixas como Ainda me Iludo e uma leitura de Desculpa o Auê, de Rita Lee e Roberto de Carvalho. “A gente vive um momento tão estranho e, de tempos em tempos, tenho a sensação de que é necessário falar de amor. Eu gosto de falar tanto do amor bem-sucedido como aquele nem tanto”, diz.
“Na maioria dos momentos, a música substituiu as palavras que não sabemos dizer. Falar de amor é o que me move e por meio dele passar boas mensagens", afirma o cantor. Mas Péricles, uma das vozes mais importantes do pagode e samba, avisa que só falar de amor não basta. “Mais importante que isso seria as pessoas ouvirem quem está falando de amor”, ensina ele, lembrando de MC Marcinho, que morreu aos 45 anos, e dedicou a carreira também a cantar o amor.
O pagode, Péricles explica, faz parte desse cenário. “A contribuição do pagode fez com que aquela couraça do homem indestrutível caísse por terra”, explica. “Uma música com ‘eu gamei em você’... Um homem dizer isso é uma semente plantada. Infelizmente o homem foi criado dessa maneira, foi uma mensagem que vinha dos nossos antepassados, pais e avós, mas hoje pela música a gente tem uma outra mentalidade”, avalia.
Para chegar às oito músicas do álbum o cantor ouviu centenas de músicas, em um processo ao qual ele está mais que habituado – já chegou a escutar 5 mil para um outro trabalho de 15 faixas. “Vou separado por temas que são muito próximos e são vários dias deixando esse repertório mais apurado para o público”, conta.
Desculpa o Auê (“praticamente escrita como um pagodinho indolente") é uma homenagem para Rita Lee, que morreu em maio. Péricles já queria há tempos gravar a cantora, e a primeira parte da música foi gravada em ritmo de bossa nova, com o artista cantando no seu tom habitual. A segunda parte em pagode, no tom original da primeira gravação de Rita, que tinha uma extensão de voz diferente da dele.
PAGODE, SIM
Péricles acredita que o pagode e o samba estão mais vivos do que nunca. “Às vezes os olhos das pessoas mudam para outros segmentos e tudo bem. O pagode sempre cumpriu seu dever de abraçar todo mundo”, pontua, lembrando a interseção entre os dois e citando novos nomes. “Marvvila, Ana Clara...Tem artistas surgindo e é uma felicidade imensa”, garante.
“Sou sambista e adoro um pagode, que é uma reunião para cantar samba. Venho dos anos 1990, onde a gente tinha rótulo de pagodeiro”, diz Péricles, que teve Céu Lilás, lançado em 2021, indicado ao Grammy Latino como Melhor Álbum de Samba/ Pagode. “Fui indicado junto com a Ludmilla [que ganhou], era a segunda vez. Para mim, só a indicação já é um prêmio, ganhar é consequência. Mas assim, ganhar [prêmios] não pode me estacionar”, afirma o cantor.
Péricles diz que gosta de ter outros compositores no seu trabalho, e entre vários nomes, ressalta Thiaguinho. “Tem grandes compositores que precisam ser ouvidos e procuro pelo meu trabalho cumprir esse dever”, diz.
Para dar conta da rotina de shows, Péricles, que nos últimos anos perdeu 40 quilos, se cuida de corpo e alma. “Não cuido só do meu organismo, cuido da do meu espírito”, diz. “Faço ginástica para o corpo, cuido de Cristo com orações e da minha mente lendo coisas boas”, ensina.
Em alguns shows, ele tem a companhia da esposa, Lidiane, com quem trabalha. “Ela é meu olho naquilo que não posso ver, e me ajuda a direcionar melhor toda nossa trajetória. Confio no tino comercial dela e procuro ajudá-la a equilibrar os pratos”, diz.
O casal tem uma filha de 3 anos, Maria Helena, que segundo pai coruja “tem muito ritmo”. Péricles é pais ainda de Lucas Morato, de 30 anos, que também é cantor – os dois assinam Calendário, a música que dá nome ao álbum. “Como pai é uma felicidade, porque vejo meu filho feliz. Como colega dividi muito e até aprendo com ele, porque Lucas tem uma visão contemporânea”, assume.
“Dou conselhos tipo ‘faça isso, não vá por ali’, não como quem já trilhou aquela caminhada, mas com o olhar do pai”, diz Péricles. Ele conta que procura estar sempre presente e ser companheiro. “Tive esse ensinamento dentro de casa e procuro passar para os meus filhos da melhor maneira. É muita correria estando muito na estrada, mas procuro compensar quando estamos juntos, sobretudo com Maria Helena, que é muito pequena”, conta.