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Sábado, 23 de novembro de 2024

Meio ambiente

Como os combustíveis fósseis são vilões do aquecimento global

Como os combustíveis fósseis são vilões do aquecimento global

(Imagem: Ria Puskas / Unsplash / Divulgação)

As emissões do setor de transportes estão entre as que mais contribuem para as mudanças climáticas: representam 14% das emissões anuais. E o Brasil está entre os top 5 países com mais emissões nesse setor.

"Carros, caminhões, ônibus e motocicletas são os grandes responsáveis pelas mudanças climáticas", diz Alexandre Prado, especialista em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil.
 

Prado explica que, no nosso país, apesar da presença de biocombustíveis, o transporte individual ainda é um significativo emissor de combustíveis fósseis e isso é um problema histórico. Os dados da última edição do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases do Efeito Estufa (Seeg) do Observatório do Clima nos ajudam a entender o por quê:

  • Historicamente, a atividade de transporte é uma das maiores emissoras do setor de energia.
  • Isso porque, a cada ano, as emissões de transporte vêm aumentando, afastando-se das curvas de outras atividades emissoras do setor.
  • Em 2019, por exemplo, os modos de transporte emitiram 196,5 megatoneladas de CO2 equivalente (CO2e), um aumento de 1% em relação a 2018.
  • Já no ano passado, veículos leves, ônibus e caminhões emitiram em cerca de 12 milhões de toneladas de CO2 a mais do que em 2021.
 

Por isso, especialistas alertam que se não agirmos urgentemente para deter a mudança climática impulsionada pelos combustíveis fósseis, ondas de calor e as demais condições climáticas extremas continuarão a ser cada vez mais comuns.

"Na matriz energética brasileira, o setor de transportes é o maior emissor de gases de efeito estufa. Se quisermos tratar da descarbonização do país, é fundamental que olhemos para a transformação desse setor como uma das prioridades", diz Marcelo Laterman, porta-voz do Greenpeace Brasil.
 

E refletir sobre o papel de nossos hábitos diários na crise climática é crucial. Embora individualmente não sejamos os únicos responsáveis pelo aquecimento global, é fundamental considerar o impacto de nossas rotinas na busca por uma vida mais sustentável.

"As emissões dos carros no nosso país, que foi planejado baseado majoritariamente no modal rodoviário, são altíssimas, assim como os desafios de descarbonização deste modelo", acrescenta Laterman.

Globalmente, de acordo com dados Agência Internacional de Energia (AIE), as emissões provenientes de viagens por estrada representam três quartos das emissões de transporte. E a maior parte dessas emissões tem como origem veículos de passageiros, como carros e ônibus, que contribuem com 45,1%. Já os caminhões de carga respondem por 29,4%.

E como o setor de transporte responde por 21% das emissões totais de poluentes, e o transporte rodoviário representa três quartos das emissões de transporte, fazendo alguns cálculos dá para dizer que, de acordo com as taxas mais recentes, o transporte rodoviário contribui com 15% das emissões totais de CO2 em todo o mundo (1% a mais que o indicado nos dados de 2014 do IPCC, conforme o gráfico acim).

"Então, a redução desse consumo e, obviamente, da sua produção e a eliminação são essenciais para a gente olhar [a questão do] 1,5ºC e reduzir ao máximo os efeitos que a gente já está vendo acontecer das mudanças climáticas", acrescenta Padro.

Esse número é o chamado “limite seguro” das mudanças climáticas.

É o limiar de aumento da taxa média de temperatura global que temos que atingir até o final do século para evitar as consequências da crise climática provocada pelo homem por causa da crescente emissão de gases de efeito estufa na nossa atmosfera.

Essa é uma taxa que é medida em referência aos níveis pré-industriais, a partir de quando as emissões de poluentes passaram a afetar significativamente o clima global.

Desde então, a quantidade de CO2 na atmosfera aumentou mais de 50% - e continua crescendo. Como consequência disso, o aquecimento global está fazendo o nosso planeta ficar mais quente, o que por sua vez está causando uma série de problemas e intensificando fenômenos naturais, como as ondas de calor, que também têm ficado cada vez mais frequentes.
 

Segundo especialistas, o aumento das ondas de calor nesta primavera, por exemplo, é atribuído à intensificação da crise climática e ao fenômeno El Niño, conforme indicam dados do Inpe.

Este ano, além de ondas de calor mais intensas, estamos tendo em espcial uma frequência mais elevada, com esse padrão se repetindo pela quarta vez consecutiva no Brasil, nos meses de agosto, setembro, outubro e novembro.

Então é por isso que falam em eliminar gradualmente ou reduzir o uso desses combustíveis?

 

Sim, a questão é bem por aí.

Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, lembra que os combustíveis fósseis – carvão, petróleo e gás – são de longe os maiores contribuintes para as alterações climáticas globais, representando mais de 75% das emissões de todo o mundo de gases de efeito de estufa, segundo dados da ONU.

Então, o fato é que o uso desses poluentes está impulsionando de forma esmagadora o aquecimento global.

E para manter o aquecimento em 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais, as emissões de gases de efeito estufa devem ser reduzidas de forma profunda, rápida e sustentável em todos os setores.

Por isso, mesmo em meio a um contexto desafiador, com a COP deste ano sendo realizada em um país produtor de petróleo, especialistas esperam algum tipo de acordo desta vez para a eliminação gradual ou redução dos poluentes. Na COP26, as Partes (os estados, como o Brasil, que participam da cúpula do clima da ONU) concordaram em reduzir subsídios aos combustíveis fósseis e o uso do carvão.

"Não há como limitar o aumento da temperatura, ou seja, resolver a crise climática, sem abordar principalmente essa causa", afirma Unterstell.
 

No entanto, na COP27, tentativas de redução global dos combustíveis fósseis encontraram obstáculos, principalmente de nações favoráveis à captura de carbono. Ambientalistas pediram avanço na discussão no ano passado, mas o texto final de Sharm El-Sheikh manteve os termos originais de Glasgow, ignorando sugestões. Enquanto alguns países se opõem à "eliminação" dos poluentes, outros, como a França, propõem zerar as emissões até 2030 com a iniciativa "ecologia à la Française".

Permanecem, porém, desacordos sobre o futuro do carvão, petróleo e gás, complicando as negociações internacionais.

Combustíveis fósseis representam mais de 75% das emissões de todo o mundo de gases de efeito de estufa. — Foto: Ria Puskas / Unsplash / Divulgação

Combustíveis fósseis representam mais de 75% das emissões de todo o mundo de gases de efeito de estufa. — Foto: Ria Puskas / Unsplash / Divulgação

Mas o que é preciso ser feito?

 

De acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês), um veículo de passageiros comum emite, em média, cerca de 4,6 toneladas métricas de dióxido de carbono por ano, um número que pode variar conforme o tipo de combustível utilizado, a eficiência do consumo de combustível e a quantidade de quilômetros percorridos anualmente.

Por isso, Daniel Guth, pesquisador em políticas de mobilidade urbana, destaca a necessidade de regulamentações para incentivar meios de transporte sustentáveis, como veículos elétricos, em resposta à emergência climática. Ele enfatiza a importância de mudar sistemicamente o paradigma nos transportes, investindo em transporte público e elétrico.

"É preciso urgência das grandes potências e dos países em desenvolvimento para que a gente mude a matriz de circulação e assim a gente combine melhor sistema de transporte com moradia, com as oportunidades no território e invista pesadamente em transporte público", diz ele.

Além disso, especialistas também sugerem que devemos sempre pensar bem nas opções que temos, como:

  1. Trocar um carro antigo, por exemplo, por um modelo mais novo: algo que pode diminuir bastante a emissão de poluentes.
  2. Além disso, se você precisa mesmo usar um veículo poluente: escolha um modelo que gaste menos combustível faz uma grande diferença. Um carro grande, por exemplo, solta em média 85% mais gases que causam o efeito estufa por quilômetro do que um carro pequeno.
 

Em cidades como São Paulo, por exemplo, Guth explica que a maior parte da infraestrutura viária é dedicada aos carros, embora eles sejam responsáveis por apenas um terço das viagens. Na visão dele, essa priorização política e econômica gerou uma falsa ideia de essencialidade do carro, pois o investimento público massivo é destinado à manutenção e expansão da infraestrutura rodoviária.

"Em resumo, o carro só se tornou uma opção com esse verniz de necessidade porque todas as políticas públicas foram para o sentido de garantir essa falsa essencialidade", afirma Daniel Guth.

*G1