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Sexta-Feira, 22 de novembro de 2024

Meio ambiente

Quatro rios da Bacia Amazônica chegam ao menor nível histórico em setembro

Quatro rios da Bacia Amazônica chegam ao menor nível histórico em setembro

(Imagem: Reprodução/TV Globo)

Quatro dos seis principais rios da Bacia Amazônica, a maior do mundo, chegaram ao nível mais baixo já registrado no histórico de medições para o mês de setembro, segundo um relatório do Sistema Geológico Brasileiro (SGB) e da Agência Nacional de Águas (ANA) ao qual o g1 teve acesso.

A estiagem recorde atinge os rios AmazonasNegroBranco e Purus, que são essenciais para a vida na região: além de leitos da biodiversidade, são hidrovias, fonte de água e de energia. E as perspectivas são desoladoras: especialistas apontam que os rios podem levar até quatro anos para voltarem a níveis normais.

O relatório do SGB e da ANA mostra o cenário mais recente dos seis principais rios da bacia, que são, além dos quatro citados acima, o Madeira e Solimões. A bacia como um todo tem mais de mil rios.

? Nos gráficos abaixo, os dados mostram as variações dentro dos anos hidrológicos (o comportamento do rio em 12 meses) com informações de toda série histórica para cada rio. O recorde anual é batido no dia em que a medição demonstra o menor nível já registrado. Observando o mês de setembro, esse foi o pior da série histórica nos quatro rios.

Gráfico mostra série histórica de nível de vazão (volume) no rio Negro — Foto: Sistema Geológico do Brasil

Gráfico mostra série histórica de nível de vazão (volume) no rio Negro — Foto: Sistema Geológico do Brasil

Veja os recordes em cada rio:

  • RIO NEGRO: no rio que serve o porto de Manaus e escoa a produção da zona franca, a seca á e maior dos últimos 120 anos no mês de setembro. A medição no rio começou em 1902. A seca no rio fez a capital do Amazonas decretar situação de emergência.
  • RIO BRANCO: o rio fica entre Roraima e o Amazonas, mas é o principal recurso hídrico do estado de Roraima, sendo o único fornecedor de água do estado. Nesta temporada de seca, ele registrou o menor nível de água desde 1967.
  • RIO PURUS: o percurso do rio passa por dezenas de municípios entre Acre e Amazonas. Ele concentra uma importante rota de pesca para os estados. Em sua série histórica, há duas áreas de medição, que mostraram datas diferentes para o recorde histórico. No trecho do Acre, teve o menor nível de água desde 1967, quando começaram as medições. E em Beruri, o menor desde 1982. Foi no local que uma vila desabou em evento de terras caídas, agravado pela seca.
  • RIO AMAZONAS: as medições no rio são divididas em três áreas e as três bateram o recorde na série histórica. No trecho de Careiro, é o menor nível desde 1977. Em Itacoatiara, é o menor desde 1998 e, em Parintins, o menor desde 1974.

Nos outros dois rios incluídos no levantamento, Madeira e Solimões, os índices não chegaram ao recorde histórico no período, mas se aproximaram dos piores índices já registrados.

Os especialistas alertam que o pior momento de seca nesta temporada ocorre em outubro e com recordes e tendências pessimistas para as vazões, é possível que se aproximem do recorde histórico anual.

Impactos da estiagem pelo país

? O impacto recente acontece no Norte e no Centro-Oeste, mas gera reflexo em todo o país em vários aspectos. Veja abaixo:

  • SECA NOS RIOS GERA EFEITO CASCATA

Os rios são interligados, ou seja, as águas de um rio são distribuídas em suas ramificações. Em uma bacia como a Amazônica, que tem cerca de mil rios, a seca cria um efeito cascata. A previsão é de que, no médio prazo, isso impacte outros estados.

  • SISTEMA DE ENERGIA INTERLIGADO

No Brasil, o sistema de energia não é independente. As usinas são conectadas e servem ao sistema que abastece o país como um todo. Com a estiagem, usinas no Norte estão sendo impactadas e isso pode ocasionar o desabastecimento não só da região, mas de parte do sistema nacional.

A usina hidrelétrica de Santo Antônio, abastecida pelo Rio Madeira, e que teve a operação completamente paralisada nesta semana é a maior do país e serve a região Sudeste. Essas pausas acabam por "sobrecarregar" o sistema.

  • LOGÍSTICA

A região Norte é um centro agrícola e abriga a Zona Franca, que fica em Manaus, e que concentra várias das maiores produtoras de eletrônicos do país. A principal via de transporte na região é pelas águas. No entanto, com a baixa dos rios, a navegação pode ser complicada e afetar a distribuição dos produtos.

O Rio Negro, por exemplo, é onde está o porto que escoa a Zona Franca e já está sendo afetado. A situação acontece perto de uma das datas de maior demanda por eletrônicos no país, a Black Friday, prevista para novembro.

A região é produtora de soja e milho, importantes commodities. Segundo o Ministério da Agricultura, existe uma preocupação com o escoamento da produção no milho com a baixa dos rios.

  • AGRICULTURA

A seca tem impactado a plantação em vários desses estados, especialmente a agricultura familiar. Um levantamento do Centro de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden) mostrou que agricultores de 79 municípios tiveram a produção afetada. Isso reduz a oferta de insumos não só na região, como no país.

Previsão de mais seca

g1 teve acesso ao mapa produzido pelo Cemaden e apresentado a órgãos do governo federal nesta semana com a previsão da situação dos rios no país até janeiro de 2024.

Os tons de laranja e marrom, que dominam a maior parte do território brasileiro, mostram os rios com previsão de volume abaixo da média.

Mapa mostra previsão de estiagem para os rios no Brasil — Foto: Arte/g1

Mapa mostra previsão de estiagem para os rios no Brasil — Foto: Arte/g1

O especialista do Cemaden Márcio Moraes, que integra a sala de crise da Região Norte, explica que os rios são interligados e a baixa vazão recorde pode afetar rios de outras regiões.

Os rios formam ramificações e vão se juntando. Se há seca em uma região, as ramificações também são impactadas ao longo do tempo. É por isso que vemos esse impacto se estender pelo mapa.
— Márcio Moraes, especialista do Cemaden e integrante da sala de crise da Região Norte

Ele reforça a preocupação com o abastecimento de energia.

“Tem pontos nessa bacia que tem as hidrelétricas. Se a seca permanecer como na previsão, as usinas vão ter que desligar turbinas e como todo o sistema nacional é interligado, vai afetar todo o nosso sistema de distribuição de energia. É uma questão nacional”, diz.

Moraes explica que a recuperação do nível dos rios é algo a longo prazo e que a expectativa é de que possa levar até quatro anos para que se estabilize os níveis normais.

Uma seca como essa não se resolve em um ano. É preciso não só volume de chuva, mas tempo para que os rios possam absorver essa água e retomar o nível normal. Estamos falando de algo em torno de quatro anos.
— Márcio Moraes, especialista do Cemaden e integrante da sala de crise da Região Norte

Causas da seca severa

Estamos na estação seca na região Norte, quando a vazão dos rios normalmente se reduz. Mas, neste ano, dois fenômenos mudaram o comportamento das chuvas em todo o país e podem afetar o restante do mapaEl Niño e o aquecimento do Atlântico Tropical Norte.

  • O El Niño provoca o aumento da temperatura das águas do Oceano Pacífico Equatorial.
  • O aquecimento do Atlântico Tropical Norte faz que as águas fiquem mais quentes.

A água dos oceanos mais quentes de cada lado do continente modificou a circulação do ar na atmosfera e direcionou a chuva mais ao sul do mapa.

? O meteorologista do Cemaden Giovani Dolif explica que é como se houvesse uma bexiga cheia de ar e você apertasse um dos lados dela.

Nessa analogia, a força que aperta é o ar quente. Quando acontece essa pressão, o ar vai para o outro lado da bexiga. Ou seja, a circulação atmosférica escoa para o outro lado do mapa, que é o sul do Brasil. E então temos chuvas nessa região. — Giovani Dolif, meteorologista do Centro de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden).

*G1