Quinta-Feira, 21 de novembro de 2024
Quinta-Feira, 21 de novembro de 2024
Proteção à democracia, defesa do meio ambiente, relação com a China e posicionamento sobre as guerras na Ucrânia e no Oriente Médio são alguns dos temas que podem impactar a relação Brasil-Estados Unidos com a vitória de Donald Trump nas eleições dos Estados Unidos.
Para analisar as perspectivas para as relações diplomáticas entre os dois países, que, neste ano, completaram 200 anos, o g1 conversou com Tanguy Baghdadi, professor de relações internacionais e fundador do podcast Petit Journal, e com Hussein Kalout, cientista político e ex-secretário de Ações Estratégicas do governo de Michel Temer.
Levando em consideração o último mandato de Donald Trump, Tanguy Baghdadi entende que o estilo de fazer política externa do ex-presidente americano é o de se aproximar de países e líderes que "aceitem sua liderança", mesmo que não sejam da mesma ala política.
"Não há uma garantia de que a relação seria ruim, até porque, o Lula também, em diversos momentos, já buscou a aproximação com líderes que não eram exatamente de esquerda. Então, há uma certa facilidade dos dois em promover esse diálogo", analisa.
Para Baghdadi, a comunicação entre o atual presidente Lula e Trump seria de uma forma mais protocolar, mantendo acordos existentes entre os dois países, o que ele descreve como "uma certa manutenção de um relacionamento bilateral respeitoso". O professor prevê ainda que, inicialmente, a relação seja de certa "desconfiança" e "frieza".
Apoio político
Tanto Tanguy Baghdadi quanto Husseim Kalout entendem que a próxima eleição presidencial no Brasil pode ser desafiadora para uma eventual chapa petista, considerando que Trump apoiou o então presidente Jair Bolsonaro em 2022 — ambos falam com o mesmo eleitorado de direita e têm discursos parecidos, diz Baghdadi.
"Se, em uma eleição futura no Brasil, nós tivermos questionamentos no processo eleitoral e uma inflexão na nossa ordem democrática, o comportamento do Trump não será igual ao comportamento do Biden ou da Kamala. Ele vai tomar um lado, né? E, provavelmente, será o lado, digamos, do bolsonarismo", comenta Kalout.
Além disso, Trump e Bolsonaro carregam outro ponto em comum: ambos são investigados pela participação em uma tentativa de golpe contra a democracia em seus respectivos países.
Em 6 de janeiro de 2021, milhares de apoiadores do republicano invadiram o Capitólio em Washington, sede do Legislativo americano, na tentativa de impedir a realização da sessão que formalizaria a vitória de Joe Biden em 2020.
Dois anos depois, em 8 de janeiro de 2023, bolsonaristas invadiram a sede dos Três Poderes com o objetivo de tentar dar um golpe de estado contra o governo recém-eleito de Lula.
Visões opostas: meio ambiente, China e Venezuela
Caso Donald Trump volte a presidir os EUA, o Brasil pode ter que lidar com uma mudança drástica em alguns segmentos, avaliam os especialistas. Apesar de o eixo comercial de investimentos ser mantido, o que diz respeito ao meio ambiente pode colapsar, entende Kalout.
O ex-secretário de Ações Estratégicas do governo Temer também acredita que o Brasil pode ser "empurrado a buscar um alinhamento quase que automático com a China, o que seria um fato inédito na política externa brasileira".
Outro ponto sensível nesta relação seria a Venezuela. Husseim Kalout explica que, por mais que o governo brasileiro cobre as atas das eleições venezuelanas de 2024 e ainda não tenha reconhecido o resultado do pleito, Trump, por sua vez, é muito mais enfático que Joe Biden e Kamala Harris ao criticar o governo de Nicolás Maduro.
Posicionamento internacional
Husseim Kalout ressalta que Brasil e Estados Unidos são considerados países parceiros, mas não aliados.
Isso porque, embora os EUA sejam o segundo maior parceiro comercial do Brasil, no entendimento americano, são aliadas as nações que se apoiam militarmente — o que não é o caso, explica o cientista político.
Os dois países têm perfis muito diferentes no que diz respeito à política externa, comenta Tanguy. Com isso, posicionamentos quanto à guerra na Ucrânia e em Israel e outros países do Oriente Médio podem ser bastante distintos. A postura do Brasil, segundo o professor, é de maior proximidade com países parecidos com o contexto brasileiro.
"Eu não espero que nenhum dos dois governos, seja um governo de Trump, seja um governo da Kamala, vá ter o Brasil como grande prioridade. Eu acho que atualmente é uma relação de distância e ela vai continuar sendo assim", conclui Tanguy Baghdadi.*G1