Terça-Feira, 26 de novembro de 2024
Terça-Feira, 26 de novembro de 2024
Depois de cinco meses de trabalho, a CPMI do 8 de Janeiro encerrou os trabalhos na terça-feira (17) com a aprovação do relatório, de autoria da senadora Eliziane Gama (PSD-MA). O documento encaminhado ao Ministério Público pede o indiciamento de 61 pessoas, entre elas, o ex-presidente Jair Bolsonaro, e propõe cinco projetos de lei a serem apreciados pelo Congresso Nacional.
Além dos resultados concretos do colegiado, também ficaram marcados os momentos de confusões entre os parlamentares, que protagonizaram embates na maior parte das reuniões deliberativas.
Durante toda a última sessão do colegiado, ficou evidente a divergência entre governistas e a oposição sobre os responsáveis pelos ataques aos palácios dos Três Poderes e em relação às possíveis omissões do governo federal para evitar a depredação dos prédios públicos.
Enquanto a base do governo elogiou o relatório e o classificou como "peça histórica em defesa da democracia", os oposicionistas criticaram o documento, tachando-o de parcial e considerando que apresenta "erros graves" por ter se desviado do objeto determinado da CPMI.
Para os senadores e os deputados da base governista, o parecer coloca de forma substanciada a linha cronológica dos atos preparatórios que antecederam as ações, até chegar ao ataque do 8 de Janeiro.
Segundo o senador Rogério Carvalho (PT-SE), as evidências revelam que houve uma tentativa de destruição da democracia por meio da instrumentalização do Estado e da cooptação da ala militar. Assim, afirmou ele, o relatório representa a realidade dos fatos e será uma "grande contribuição para a história do país".
"Não tem aqui versão, são dados fáticos. Não há questionamento sobre isso. Eu quero dizer que esta CPI coloca em evidência toda a construção golpista do governo Bolsonaro e coloca em tela para o povo brasileiro acompanhar". SENADOR ROGÉRIO CARVALHO (PT-SE)
Já a ala da oposição, contrária ao relatório, justificou seu posicionamento ao alegar que o documento é "parcial". Para os integrantes dessa ala, Eliziane construiu um relatório tendencioso, porque "ignora a verdade", ao não considerar a possível omissão por parte de membros do governo federal, como o então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Gonçalves Dias, e do ministro da Justiça, Flávio Dino.
Eles avaliaram que, diante dos avisos emitidos pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a cúpula tinha condições para agir e tentar impedir os ataques ao Palácio do Planalto.
"Esta CPMI, [foi] sequestrada, sim, pelo governo. Eu duvido que se apresente aqui alguém do governo que pediu a CPMI, que requereu, mas tomaram conta. Conseguem aprovar um relatório, mas a verdade vai aflorar", afirmou o senador Esperidião Amin (PP-SC).
"Esta omissão grotesca, continuada, perspicaz e, lamentavelmente, acolhida pelo relatório, anistiando o ex-chefe do GSI e o ministro da Justiça, Flávio Dino, que não cumpriu com seu dever, mesmo advertido a tempo, isso não vai ficar assim". SENADOR ESPERIDIÃO AMIN (PP-SC)
Segundo dados da própria CPMI, ao longo da investigação, os deputados e os senadores analisaram 656 documentos sigilosos recebidos, 23,7 mil arquivos, 3.720 horas de vídeo e 21.140 de áudio. Foram 23 reuniões e 20 depoimentos; na maioria deles houve embate entre parlamentares da oposição e do governo.
Na primeira oitiva, do ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques, um bate-boca generalizado foi instalado após Eliziane questioná-lo sobre um caso de agressão a um frentista, no qual supostamente Vasques estaria envolvido.
A pergunta irritou parlamentares da oposição, que alegaram que Eliziane estaria tentando persuadir Vasques a responder a perguntas sem relação com os atos antidemocráticos.
"Ela está pressionando o depoente", afirmou o deputado Delegado Éder Mauro (PL-PA). Na ocasião, a sessão foi suspensa temporariamente. Silvinei é alvo de pedido de indiciamento no relatório final da CPMI.
Parlamentares também se envolveram em uma confusão durante o depoimento do ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Depois de um discurso inflamado do deputado Marco Feliciano (PL-SP), membros do colegiado questionaram um tapa que ele teria dado na bancada ao responder à senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS).
Depois disso, Eliziane Gama pediu respeito à colega e comentou que "essa mania de bater na mesa contra uma mulher" era muito feia. Ao se defender, Feliciano chamou os parlamentares de "turminha da esquerda" e "mimizentos". "A senadora pode colocar o dedo no meu nariz, e eu não posso falar nada?", completou.
Em outro episódio, durante o depoimento do general Augusto Heleno, o presidente da CPMI, deputado Arthur Maia (União-BA), expulsou o deputado Abilio Brunini (PL-MT) da sessão por estar "tumultuando" a reunião. O parlamentar já havia sido advertido em outras sessões por fazer piadas e interromper os colegas.
Na mesma sessão, o próprio general Heleno protagonizou um barraco com a deputada Duda Salabert (PDT-MG), após a parlamentar questionar a atuação de Heleno no Haiti, que comandou a missão de paz da ONU, a cargo do Brasil, no combate e na eliminação das gangues que controlavam boa parte do território de Porto Príncipe.
"Essa é uma afirmativa mentirosa. Se eu quiser, eu vou para a Justiça, processo o senhor e boto o senhor na cadeia", declarou. No mesmo instante, Duda corrigiu o general: "É senhora".
O clima de embate entre oposição e governistas durou até o último minuto da CPMI. Após a aprovação do relatório, uma confusão entre um assessor parlamentar do deputado Carlos Jordy (PL-RJ) acabou em tumulto no Salão Azul do Senado. Na ocasião, os parlamentares faziam caminhada do Senado até a praça dos Três Poderes, com a Constituição em mãos, quando o assessor começou a filmar os senadores e acusá-los de apoiar o grupo islâmico Hamas, responsável pelos ataques de 7 de outubro contra o território israelense.
Em seguida, é possível ver que o deputado federal Rogério Correia (PT-MG) tenta derrubar o celular do assessor, que acaba caindo na cabeça da senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS). No momento do tumulto, a senadora grita e diz que foi agredida e pede para segurarem o assessor, que corre do local. Rodrigo Duarte Barros ocupava o cargo de secretário parlamentar no gabinete de Jordy desde janeiro de 2022. Após a confusão, ele foi exonerado do cargo.
No relatório, Eliziane pediu o indiciamento de 61 pessoas, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro; os ex-ministros Braga Netto e Augusto Heleno; e o ex-ajudante de ordens Mauro Cid. Ela alega que os citados têm envolvimento em crimes como associação criminosa, violência política, abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe de Estado.
No total, o documento tem 1.333 páginas e faz uma retrospectiva dos atos extremistas e dos episódios que antecederam os ataques às sedes dos Três Poderes. Também sugere transformar a data 8 de janeiro em Dia da Resistência Democrática.
No total, 26 delitos são citados no texto, distribuídos entre os nomes que constam no relatório. O documento foi enviado para instâncias de investigação, como o Ministério Público Federal (MPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR).
Confira a lista completa dos 61 alvos dos pedidos para indiciamento do relatório da CMPI do 8/1:
1. Jair Bolsonaro, ex-presidente da República; 2. general Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil; 3. general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional; 4. general Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro; 5. general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa de Bolsonaro; 6. Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e ex-secretário de Segurança Pública do DF; 7. general Freire Gomes, ex-comandante do Exército; 8. almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha; 9. general Carlos José Penteado, ex-secretário-executivo do GSI; 10. general Carlos Feitosa Rodrigues, ex-chefe da Secretaria de Coordenação e Segurança Presidencial do GSI; 11. general Ridauto Lúcio Fernandes, ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde; 12. tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; 13. coronel Marcelo Costa Câmara, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; 14. sargento Luis Marcos dos Reis, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; 15. Carla Zambelli (PL-SP), deputada federal; 16. coronel Elcio Franco, ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde; 17. coronel Jean Lawand Júnior; 18. Felipe Martins, assessor especial para Assuntos Internacionais de Bolsonaro; 19. major Ailton Gonçalves Moraes Barros; 20. Marília Ferreira de Alencar, ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça e ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF; 21. Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal; 22. Alexandre Carlos de Souza, policial rodoviário federal; 23. Marcelo de Ávila, policial rodoviário federal; 24. coronel Wanderli Baptista da Silva Júnior, ex-diretor-adjunto do Departamento de Segurança Presidencial do GSI; 25. coronel André Luiz Furtado Garcia, ex-coordenador-geral de Segurança de Instalações do GSI; 26. tenente-coronel Alex Marcos Barbosa Santos, ex-coordenador-adjunto da Coordenação-Geral de Segurança de Instalações do GSI; 27. capitão José Eduardo Natale, ex-integrante da Coordenadoria de Segurança de Instalações do GSI; 28. sargento Laércio da Costa Júnior, ex-encarregado de segurança de instalações do GSI; 29. coronel Alexandre Santos de Amorim, ex-coordenador-geral de Análise de Risco do GSI 30. tenente-coronel Jader Silva Santos, ex-subchefe da Coordenadoria de Análise de Risco do GSI; 31. coronel Fábio Augusto Vieira, ex-comandante da PMDF; 32. coronel Klepter Rosa Gonçalves, subcomandante da PMDF; 33. coronel Jorge Eduardo Naime, ex-comandante do Departamento de Operações da PMDF; 34. coronel Paulo José Ferreira de Sousa Bezerra, comandante em exercício do Departamento de Operações da PMDF; 35. coronel Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues, comandante do 1º CPR da PMDF; 36. major Flávio Silvestre de Alencar, comandante em exercício do 6º Batalhão da PMDF; 37. major Rafael Pereira Martins, chefe de um dos destacamentos do BPChoque da PMDF; 38. George Washington de Oliveira Sousa, condenado por participar da tentativa de explosão de bomba próximo ao aeroporto de Brasília; 39. Alan Diego dos Santos, condenado por participar da tentativa de explosão de bomba próximo ao aeroporto de Brasília; 40. Wellington Macedo de Souza, condenado por participar da tentativa de explosão de bomba próximo ao aeroporto de Brasília; 41. Tércio Arnaud, ex-assessor de Bolsonaro, apontado como integrante do chamado "gabinete do ódio"; 42. José Matheus Sales Gomes, ex-assessor de Bolsonaro, apontado como integrante do chamado "gabinete do ódio"; 43. Fernando Nascimento Pessoa, assessor de Flávio Bolsonaro, apontado como integrante do chamado "gabinete do ódio"; 44. Maurício Junot, empresário; 45. Adauto Lúcio de Mesquita, financiador; 46. Joveci Xavier de Andrade, financiador; 47. Meyer Nigri, empresário; 48. Ricardo Pereira Cunha, financiador; 49. Mauriro Soares de Jesus, financiador; 50. Enric Juvenal da Costa Laureano, financiador; 51. Antônio Galvan, financiador; 52. Jeferson da Rocha, financiador; 53. Vitor Geraldo Gaiardo , financiador; 54. Humberto Falcão, financiador; 55. Luciano Jayme Guimarães, financiador; 56. José Alipio Fernandes da Silveira, financiador; 57. Valdir Edemar Fries, financiador; 58. Júlio Augusto Gomes Nunes, financiador; 59. Joel Ragagnin, influenciador; 60. Lucas Costar Beber, financiador; 61. Alan Juliani, financiador.
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