O projeto de lei que ajusta a quantidade de deputados por estado deve avançar na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara no segundo semestre. A proposta prevê que sete estados perderiam deputados, enquanto outros sete ganhariam. Os estados mais beneficiados seriam o Pará e Santa Catarina — cada um ganharia quatro deputados. O mais prejudicado seria o Rio de Janeiro, que perderia quatro parlamentares. As bancadas de doze estados e do Distrito Federal permaneceriam inalteradas. A revisão ocorreria sem mudança no número total de deputados, mantendo a Câmara com 513 parlamentares.
A Constituição determina que cada estado deve ter entre 8 e 70 parlamentares, conforme o tamanho da população. Esse número deve ser revisado de tempos em tempos, no entanto, a última atualização aconteceu em 1993.
Justamente devido ao longo período sem atualização é que a aprovação do projeto de lei tem sido pressionada por decisões judiciais. O STF (Supremo Tribunal Federal) estabeleceu o prazo de 30 de junho de 2025 para que os deputados ajustem a distribuição das cadeiras na Câmara Federal, considerando o último Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O texto do projeto de lei também prevê que o tamanho da representação de cada estado e do Distrito Federal precisa ser revisado sempre que houver a atualização do Censo Demográfico pelo IBGE.
Caso os deputados não tomem uma decisão, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) poderá determinar, até 1º de outubro de 2025, o número de deputados federais de cada estado e do Distrito Federal para a legislatura que começará em 2027.
O autor do projeto de lei, deputado Rafael Pezenti (MDB-SC), vê um cenário favorável para a votação da proposta, apesar da tendência de baixa presença de deputados no segundo semestre devido às eleições municipais. “Se o Congresso não aprovar a lei, o TSE terá autonomia para definir o novo número de parlamentares. Dado o atual clima de tensão entre o Congresso e o STF, acredito que o Congresso não será omisso.”
O deputado está ciente de que a proposta vai gerar discussões e controvérsias na Câmara Federal, pois altera não apenas a correlação de forças na Casa Baixa, mas também a quantidade de emendas parlamentares disponíveis para os estados a cada ano.
Os estados com mais cadeiras terão um número maior de parlamentares para alocar emendas impositivas. Se for considerada uma média de R$ 35 milhões em emendas parlamentares impositivas por deputado, quatro novos deputados representariam R$ 140 milhões a mais por ano para Santa Catarina e o Pará, por exemplo.
“Em um mandato [de quatro anos], isso é meio bilhão de reais que estamos perdendo [o estado de Santa Catarina]. Mas, mais importante que isso, é a força política. Estamos em uma situação de desigualdade de poder. A redistribuição dará igualdade política e aumentará o volume de recursos para os estados que ganharam população. Os estados com mais deputados do que deveriam têm uma vantagem que não é justa”, afirma Pezenti.
A escolha do relator da matéria, que ficou com o deputado Danilo Forte (União-CE), é uma parte importante da estratégia para garantir a aprovação do projeto. Com um relator do Nordeste, região que será mais impactada pela redistribuição, a intenção é construir a narrativa de que a proposta não é um conflito entre o Sul e o Norte-Nordeste, mas de uma medida equilibrada para todas as regiões.
Os apoiadores do projeto também apostam na matemática para garantir a aprovação na Câmara. Se somarmos os deputados dos estados que manterão suas bancadas e aqueles que ganharão novos parlamentares, o total será suficiente para garantir a aprovação da matéria.
Como a proposta é um projeto de lei complementar, para ser aprovada, ela precisa passar pelas comissões e conseguir a aprovação da Câmara por maioria absoluta, o que significa que pelo menos 257 deputados devem votar a favor. Após essa etapa, o texto é enviado ao Senado, onde são necessários 41 votos favoráveis para sua aprovação.
Na próxima semana, a CCJ deve realizar uma audiência pública para debater o tema. Entre os convidados estão os ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia, do STF, e o procurador-geral da República, Paulo Gonet.
Proposta melhora, mas não resolve problema da proporcionalidade
Alexandre Rollo, advogado especializado em direito eleitoral, considera positiva a revisão da proporcionalidade da Câmara dos Deputados, mas aponta um vício de forma e uma falsa proporcionalidade na atual divisão.
Ele destaca que, de acordo com as regras atuais, um deputado federal do Acre representa pouco mais de 100 mil habitantes, enquanto um deputado federal de São Paulo representa cerca de 650 mil habitantes, ou seja, seis vezes mais.
“A Casa que representa os estados e o Distrito Federal é o Senado, com três senadores para cada estado, independentemente da população. Já a Câmara representa a população. Nesse sentido, a população de São Paulo está sub-representada na Câmara dos Deputados”, afirma.
“O projeto demorou para ser discutido e traz uma melhora na proporcionalidade, mas não resolve o vício de origem, que está na Constituição Federal. Portanto, seria necessária a discussão de uma PEC para a correção desse ponto”, finaliza.
O especialista em direito constitucional Tiago Oliveira concorda que o sistema representativo atual precisa ser repensado. Ele lembra que essa forma de representação data da Constituinte de 1890, ganhou força durante o governo militar e foi se renovando nas constituições seguintes.
“Acredito que a melhor forma de reparar e equilibrar a representação de cada Estado seja por meio de novo cálculo matemático simples, uma vez que não é fácil encontrar a solução para este tema que é muito complicado e que vem há décadas sendo estudado, mas nunca enfrentado pelos congressistas”, diz.
O advogado Leonardo Roesler comenta que a revisão do número de deputados por estado é um processo complexo que requer debate e o mínimo de consenso político. A necessidade de negociar interesses estaduais e partidários pode tornar o processo mais demorado e complicado.
“Em 2024, teremos as eleições municipais, o que reduzirá a disponibilidade e o foco dos parlamentares, muitos dos quais estarão envolvidos em campanhas eleitorais. Além disso, temas de grande relevância e complexidade, como a reforma tributária e o orçamento federal, já estão na pauta e exigem significativa atenção dos legisladores. Essas questões estruturais são prioritárias e podem dominar os debates no Congresso, potencialmente atrasando a discussão sobre a redistribuição das cadeiras na Câmara. A possibilidade de que o Congresso não consiga chegar a uma conclusão dentro do prazo estabelecido pelo STF é real”, explica.