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Sábado, 15 de março de 2025

Política

Novo orçamento secreto? Organizações e partidos criticam novas regras para emendas

Novo orçamento secreto? Organizações e partidos criticam novas regras para emendas

(Imagem: Marcos Oliveira/Agência Senado )

As novas regras para emendas parlamentares aprovadas pelo Congresso Nacional nesta semana deixam brechas para que não haja transparência na fiscalização dos recursos, e o tema pode voltar a ser analisado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) poucos meses após o embate com a corte que levou à suspensão dos pagamentos. No fim do ano passado, o ministro Flávio Dino exigiu que o parlamento adotasse medidas para garantir a lisura do processo de indicação dos valores, mas uma proposta votada por deputados e senadores nos últimos dias dribla a imposição do STF. Parlamentares e organizações avaliam que as mudanças podem permitir a continuidade de uma prática que ficou conhecida como orçamento secreto.

 

O texto que foi aprovado pelo Congresso não obriga deputados e senadores a informar algumas emendas indicadas por eles. Além disso, a proposta não deixa claro como funcionará o sistema de monitoramento dos repasses.

Um dos trechos da proposta define que indicações de emendas de bancadas estaduais e emendas de comissão devem ser enviadas de forma coletiva. Nesses casos, apenas um parlamentar assinaria as indicações em nome dos outros congressistas, sem a identificação dos reais autores das emendas.

As críticas à matéria são por ela ignorar pontos exigidos pelo Supremo para emendas, como mais transparência e rastreabilidade dos recursos.

Ao R7, o gerente do Centro de Conhecimento Anticorrupção da Transparência Internacional, Guilherme France, considerou que o texto não atende às exigências do STF e contraria o interesse público para monitoramento dos investimentos políticos.

“Esse problema de fiscalização vai permanecer, só que com novas figuras interpostas. Tanto o líder partidário quanto o coordenador de bancada, em diversos cenários, vão assumir a titularidade [da indicação das emendas], e a gente vai continuar sem conseguir identificar quem são os parlamentares que propuseram as emendas. Isso gera um problema não só em termos de transparência, possibilidade de identificação, mas também a própria dificuldade de eventuais casos de corrupção e conflitos de interesse”, avalia.

Em nota conjunta, as entidades Transparência Brasil e Contas Abertas reclamam que a proposta criou um novo tipo de emenda que dispensa a informação de qual político patrocinou o envio.

“Não há, por exemplo, regras claras sobre os processos decisórios em ambos os espaços, nem tampouco registros públicos das suas deliberações. Empoderar estas bancadas sem as devidas salvaguardas promove a opacidade e dificulta o controle social sobre o processo orçamentário em afronta à Constituição”, dizem as instituições.

STF deve ser acionado

A resolução aprovada pode ser discutida pelo STF. O PSOL, que no passado apresentou uma ação na corte que levou à extinção do orçamento secreto (sistema que permitia que parlamentares destinassem bilhões de reais do orçamento federal para obras, projetos e serviços em suas bases eleitorais sem transparência sobre os beneficiários e critérios de distribuição), confirmou que voltará a acionar o Supremo para questionar as regras validadas pelos congressistas.

“O partido vai denunciar a figura da emenda de liderança’, que nada mais é que um atalho para que os líderes partidários indiquem as emendas de comissão — sem transparência, rastreabilidade e sem explicitar os reais autores das emendas”, afirmou o partido. Organizações como a Transparência Internacional também devem recorrer ao STF.

Ao R7, o professor associado de direito constitucional da USP (Universidade de São Paulo) Rubens Beçak acredita que novos debates na Justiça podem gerar desgaste político.

“Eu acho perfeitamente plausível a gente imaginar um cenário que esta emenda venha a ser examinada em sede de controle de constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, na medida em que ela não atende todos os pontos colocados lá atrás pelo ministro Flávio Dino”, afirma. “Mas, politicamente, pode gerar um desgaste ainda maior numa relação que já vem bem estremecida”, completa.

O ministro Flávio Dino sinalizou para a continuidade dos diálogos e avaliou que as regras aprovadas pelo Congresso representaram algum avanço.

“Há o diálogo, e há decisões que levam a novos diálogos, e assim sucessivamente, para que nós possamos, como houve no orçamento secreto, ter um acúmulo de progressos.”

Questionado pela reportagem, o senador Eduardo Gomes (PL-TO), que relatou a proposta, reconheceu a possibilidade de uma possível reação negativa do STF ao texto aprovado pelo Congresso, mas considerou que a versão aprovada atende os requisitos definidos.

Regras aprovadas

O texto aprovado pelo Congresso estabelece a obrigatoriedade de que as atas de apresentação e indicação de emendas sejam elaboradas em um sistema eletrônico, sempre que possível.

Também afirma a necessidade de que as emendas sigam as disposições do artigo 166 da Constituição Federal, que impõe restrições para evitar a alocação descontrolada de recursos.

Outra mudança é que nenhuma emenda poderá ser aprovada em valor superior ao solicitado originalmente, exceto em casos de remanejamento entre emendas do mesmo parlamentar.

*R7