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Segunda-Feira, 13 de maio de 2024

Política

Para flexibilizar armas, Câmara dos Deputados agora foca em dar autonomia aos estados

Para flexibilizar armas, Câmara dos Deputados agora foca em dar autonomia aos estados

(Imagem: Bruno Spada/Câmara dos Deputados )

Após restrições impostas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à legislação que flexibilizava o porte e a posse de armas de fogo, a oposição na Câmara dos Deputados– alinhada ao ex-presidente Jair Bolsonaro– tenta avançar na política armamentista conferindo poder aos estados para legislar sobre o tema.

Um projeto aprovado nesta semana na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) autoriza estados e o Distrito Federal “a disporem de forma específica sobre a posse e o porte de armas de fogo, para fins de defesa pessoal, práticas desportivas e de controle de espécies exóticas invasoras".

Se a proposta se tornar lei, os estados que decidirem fazer legislação específica sobre o assunto precisarão comprovar que têm condições de fiscalizar os donos das armas.

O texto em análise também define que as futuras autorizações estaduais só garantiriam o uso ou a posse das armas dentro de seu território.

A votação na CCJ foi apertada, o que indica que o debate tende a ser dividido. O texto também passou pela Comissão de Segurança Pública e está pronto para ser pautado no plenário, mas ainda não há uma data definida para a votação e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) não se manifestou.

O que dizem os especialistas

 

O modelo proposto é semelhante ao adotado nos Estados Unidos, onde cada estado define sua própria legislação sobre o tema. Apesar disso, especialistas apontam que, por lá, o controle de armas é frágil.

"Nos Estados Unidos, existem estados onde sequer se analisam antecedentes criminais para a compra de arma de fogo", diz Roberto Uchoa, membro do conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. "Em outros é permitida venda para adolescentes. Isso faz com que quem queira comprar uma arma consiga, se deslocando para outros estados".
 

Ele diz que o projeto traz a “pior ideia que já tiveram sobre fiscalização e controle de armas de fogo em décadas”.

“Em termos de segurança pública isso vai ser muito negativo, porque com o controle centralizado a gente já tem um problema de desvios de armas do mercado legal para o ilegal, imagina cada estado podendo decidir requisitos para liberação, tipos de arma, será o descontrole total", afirma Uchoa.

Para a professora de Direito Constitucional da FGV, Eloisa Machado, o texto é inconstitucional e dificultaria o controle da circulação de armas.

“Se for autorizado que cada estado tenha uma legislação específica, na prática a gente pode ter um cenário de caos normativo, com pouco controle da circulação destas armas e um impacto negativo para segurança pública”.
 

A professora alerta para uma tentativa de esvaziar a política de controle de armas no Brasil. “Nos últimos 4 anos isso foi feito por uma série de decretos emitidos pelo ex presidente Jair Bolsonaro, e agora há essa tentativa também por parte dos seus seguidores de criar um atalho e um buraco no Estatuto do Desarmamento”.

A preocupação com a fiscalização também foi mencionada em nota técnica divulgada pelo instituto Sou da Paz. Além de ver a proposta como inconstitucional, o Sou da Paz afirma que em países em que é possível adotar legislações estaduais sobre o tema, os efeitos para segurança pública são negativos, incluindo o aumento no número de armas roubadas.

“Além dos impactos sobre a circulação geral de armas de fogo no país e sobre indicadores criminais, permitir que as unidades da federação adotem diferentes normativas relacionadas à posse e ao porte de armas acrescenta um fator de grande complexidade à fiscalização dessas regras e ao cotidiano do policiamento, dada a natureza do livre trânsito entre divisas estaduais”, afirma o Sou da Paz.
 

Debates

 

Durante a votação do projeto na comissão, deputados falaram sobre a possibilidade de questionamento da constitucionalidade da medida caso seja aprovada – o PSOL já afirmou que recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF) se o texto se tornar lei.

A deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) disse que o argumento é o artigo 21 da Constituição, que aponta como prerrogativa da União legislar sobre o armamento ao apontar que "compete à União autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de material bélico".

Para o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), se mais armas entrarem em circulação, mais mortes ocorrerão e as políticas serão enfraquecidas.

Deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) é um dos parlamentares que se opõe ao texto. — Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) é um dos parlamentares que se opõe ao texto. — Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

“[É ] Mais um retrocesso baseado na perniciosa concepção americanóide do cada cidadão uma arma”, afirmou.
 

O líder do maior bloco da Câmara, Aureo Ribeiro (SD-RJ), defende maior flexibilização do porte de armas, mas acredita que isso não pode ocorrer através dos estados. "Acho que a gente tem que flexibilizar os armamentos para alguns setores, mas acho que não pode ser por estados", afirma.

Ele acredita que o projeto pode não ser pautado no plenário por ir de encontro à Constituição. "Vou me posicionar para nem colocar em plenário um projeto como esse. Temos que resolver o problema do Brasil e não de estados específicos", disse o líder.

Projeto já foi aprovado na CCJ, presidida pela autora do texto, a deputada Caroline de Toni (PL - SC) (no telão). — Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Projeto já foi aprovado na CCJ, presidida pela autora do texto, a deputada Caroline de Toni (PL - SC) (no telão). — Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Presidente da CCJ e autora do projeto, a deputada Caroline de Toni (PL-SC) justificou a apresentação do projeto como necessário em razão das dimensões do Brasil e as “realidades diferentes nos vários Estados da Federação”.

“No atual cenário deste ano de 2023, no qual o novo Governo Federal vem impondo fortes limitações a este segmento de armas de fogo, sinalizando com outras séries de restrições a serem implementas, todas as iniciativas para evitar este retrocesso normativo são bem-vindas, desde que promovidas pacificamente, e dentro da legalidade”, diz ela.

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