Domingo, 28 de dezembro de 2025
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Após a tentativa frustrada de Silvinei Vasques, o ministro do STF decreta prisão domiciliar a dez condenados pela conspiração antidemocrática. Segundo o magistrado, há um "modus operandi" de burlar as penas impostas pela Justiça
O ministro Alexandre de Moraes durante sessão na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que realiza o quinto dia de julgamento dos réus do Núcleo 1 da trama golpista, formado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete aliados (Imagem: Marcelo Camargo / Agência Brasil)
Por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a Polícia Federal cumpriu dez mandados de prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica contra condenados da chamada trama golpista. A medida busca evitar novas fugas e garantir o cumprimento das penas impostas pelo Supremo, em meio à execução das decisões já em andamento.
A ordem saiu logo após a prisão, no Paraguai, do ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques, que rompeu a tornozeleira eletrônica e tentou deixar o Brasil usando passaporte falso. O episódio reforçou a percepção, segundo ressaltou Alexandre de Moraes, de que existe risco concreto de evasão entre parte dos condenados.
Na decisão, o ministro afirma que há "um padrão de condutas indicativo de fuga" e diz que "o modus operandi da organização criminosa condenada pelo Supremo Tribunal Federal indica a possibilidade de planejamento e execução de fugas para fora do território nacional, como feito pelo réu Alexandre Ramagem, inclusive com a ajuda de terceiros".
A Polícia Federal cumpriu os mandados em oito unidades da Federação — Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Paraná, Goiás, Bahia, Tocantins e Distrito Federal — com atuação coordenada das equipes da PF. Em localidades onde havia militares entre os alvos, houve apoio de tropas do Exército para garantir a segurança das diligências.
Os dez condenados alcançados pela ordem são réus dos núcleos 2, 3 e 4 da trama golpista, julgados e condenados pela Primeira Turma do STF por crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Entre eles estão Filipe Martins, ex-assessor internacional de Jair Bolsonaro, condenado a 21 anos de prisão; Marília Alencar, ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça; Guilherme Marques, tenente-coronel do Exército; Fabrício Moreira de Bastos, coronel do Exército; Ailton Gonçalves, ex-major do Exército; Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, tenente-coronel do Exército; Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército; Giancarlo Rodrigues, subtenente do Exército; Ângelo Denicoli, major da reserva; e Carlos César Moretzsohn Rocha, presidente do Instituto Voto Legal (IVL), que não foi localizado e é considerado foragido.

Moraes determinou que todos usem tornozeleira eletrônica, entreguem os passaportes, fiquem proibidos de manter contato entre si, não utilizem redes sociais e tenham o porte de arma suspenso. Segundo o ministro, essas restrições visam "assegurar a eficácia das decisões e impedir a repetição de condutas voltadas à obstrução da Justiça".
O despacho cita que a adoção de medidas mais duras decorre de uma "sequência de episódios" que demonstram capacidade organizada de alguns réus em planejar rotas de fuga, receber apoio logístico e tentar escapar da execução das penas. Segundo Moraes, as cautelares anteriores "não se mostraram suficientes" diante do cenário mais recente.
Os mandados atingem condenados que já estavam sob medidas cautelares diversas da prisão, como uso de tornozeleira e liberdade restrita. A partir de agora, os réus passarão a cumprir prisão domiciliar mais rígida, sem autorização de saída e sob monitoramento permanente.
Para Moraes, a manutenção de certas liberdades poderia permitir novas tentativas de evasão e comprometer a autoridade do Supremo. No texto, ele afirma que há "inequívoca intenção de alguns condenados em frustrar a aplicação da lei penal", apontando "comportamentos coordenados, estruturados e dotados de apoio logístico", o que justificaria a necessidade de reação "rápida, firme e proporcional à gravidade das condutas".
O ministro também registrou que o risco de evasão "não é hipotético", mas sustentado em fatos recentes. Ele escreveu que não se trata de "descumprimentos pontuais", mas de "um conjunto de iniciativas deliberadas para ocultação de paradeiro, saída clandestina do território nacional e afronta direta às decisões desta Corte".
A Polícia Federal informou que as diligências começaram ainda nas primeiras horas do dia e seguiram ao longo da manhã e da tarde. Os agentes compareceram aos endereços dos condenados para notificar a prisão domiciliar e ajustar as novas condições impostas pelo STF, garantindo a execução imediata da decisão.
Moraes deixou claro que as medidas têm caráter preventivo e buscam proteger "a autoridade das decisões judiciais, a efetividade da execução penal e a ordem pública". Ele determinou monitoramento contínuo e comunicação imediata ao Supremo caso haja qualquer violação, alertando que descumprimentos poderão resultar em sanções ainda mais rígidas.
O ministro destacou que a operação não se encerra com o cumprimento dos mandados. Segundo o despacho, haverá acompanhamento permanente entre STF, Polícia Federal, Ministério Público e órgãos de inteligência. Moraes afirma que a complexidade das condutas e a capacidade de organização demonstrada por alguns condenados exigem vigilância constante e atuação coordenada das instituições.
A decisão também cita a necessidade de articulação internacional. O relator dos processos sobre a trama golpista registrou que há indícios de planejamento prévio e uso de rotas de saída do país, o que reforça a importância de diálogo com autoridades estrangeiras e sistemas de controle de fronteiras. O objetivo é impedir que a aplicação da lei penal brasileira seja frustrada por estratégias transnacionais e assegurar que as decisões do Supremo sejam efetivamente cumpridas.
Em nota divulgada, a defesa de Filipe Martins afirmou que a decisão do ministro Alexandre de Moraes de impor prisão domiciliar ao ex-assessor representa "mais um abuso" e não tem fundamento jurídico, pois teria sido motivada por um "ato de terceiro", em referência à tentativa de fuga de Silvinei Vasques, pessoa que, segundo os advogados, não integra o convívio do cliente.
A defesa sustentou, ainda, que Martins vem cumprindo "de forma exemplar" todas as medidas cautelares anteriormente impostas pelo Supremo, lembrando que, em novembro, o próprio ministro recuou de uma ameaça de prisão após constatar erro na leitura de dados da tornozeleira eletrônica, e reforça que ele não cometeu os atos que lhe são atribuídos pela Procuradoria-Geral da República.
O Correio não localizou a defesa dos outros réus.
*Correio Braziliense