Segunda-Feira, 25 de novembro de 2024
Segunda-Feira, 25 de novembro de 2024
O hacker Walter Delgatti prestou depoimento à CPI dos Atos Golpistas nesta quinta-feira (17) no Congresso Nacional.
Preso desde o dia 2 de agosto por invasão a sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Delgatti ficou conhecido nacionalmente em 2019, quando vazou mensagens de diversas autoridades envolvidas na operação Lava Jato. O episódio, investigado na operação Spoofing, ficou conhecido como "Vaza Jato".
Ele foi convocado para comparecer à CPI dos Atos Golpistas após uma operação da Polícia Federal, que também mirou a deputada bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP). Os agentes da PF apuram a inserção de alvarás de soltura e mandados de prisão falsos no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões, do CNJ.
À CPI nesta quinta-feira, Delgatti afirmou que:
Delgatti afirmou aos integrantes da CPI que, durante uma reunião no Palácio da Alvorada com Jair Bolsonaro (PL) antes das eleições de 2022, o então presidente assegurou que concederia um indulto (perdão presidencial) a ele, caso fosse preso ou condenado por ações sobre urnas eletrônicas.
Questionado pela relatora da comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), se recebeu garantia de proteção do ex-presidente, Delgatti confirmou.
"A ideia ali era que eu receberia um indulto do presidente. Ele havia concedido um indulto a um deputado federal. E como eu estava com o processo da Spoofing à época, e com as cautelares que me proibiam de acessar a internet e trabalhar, eu visava a esse indulto. E foi oferecido no dia", declarou.
No depoimento, o "hacker da Vaza Jato" disse que, em conversa com Bolsonaro, ouviu que o entorno do então presidente já havia conseguido grampear o ministro Alexandre de Moraes, integrante do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Segundo Delgatti, na ligação, Bolsonaro teria sugerido que Delgatti Neto "assumisse a autoria" do grampo.
"Segundo ele [Bolsonaro], eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à época, do ministro Alexandre de Moraes. Que teria conversas comprometedoras do ministro, e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo", disse.
Ainda de acordo com o hacker, a ideia por trás dessa estratégia era evitar questionamentos "da esquerda" – já que, por ter hackeado autoridades ligadas à operação Lava Jato, em anos anteriores, ele gozaria de prestígio entre os opositores de Bolsonaro.
O hacker também afirmou que a deputada Carla Zambelli teria prometido a ele um emprego na campanha à reeleição do candidato Jair Bolsonaro.
No entanto, segundo Delgatti, a proposta não avançou e ele ficou encarregado de cuidar das redes sociais da parlamentar.
Delgatti afirmou que se encontrou por acaso com Zambelli em Ribeirão Preto (SP) e se apresentou. Os dois então teriam trocado contato e, segundo o hacker, a deputada o contatou e ofereceu uma vaga de trabalho.
"Ela [Zambelli] disse que havia uma oportunidade de emprego para mim, no caso, seria na campanha do Jair Bolsonaro, do ex-presidente", declarou.
Segundo o hacker, em uma reunião com assessores de campanha de Jair Bolsonaro, ele foi aconselhado a criar um "código-fonte" falso para sugerir que a urna eletrônica era vulnerável e passível de fraude.
A proposta teria partido do marqueteiro Duda Lima em uma reunião com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, a deputada Carla Zambelli (PL-SP) e outras pessoas ligadas à parlamentar.
"A segunda ideia era no dia 7 de setembro, eles pegarem uma urna emprestada da OAB, acredito. E que eu colocasse um aplicativo meu lá e mostrasse à população que é possível apertar um voto e sair outro", disse Delgatti.
"Eles queriam que eu fizesse um código-fonte meu, não o oficial do TSE. E nesse código-fonte, eu inserisse essas linhas, que eles chamam de 'código malicioso', porque tem como finalidade enganar, colocar dúvidas na eleição", completou Delgatti.
Delgatti afirmou que sabia que estava cometendo crime ao atuar contra o processo eleitoral, mas que agiu por suposta "ordem de um presidente da República".
"Sim, eu sabia [que estava fazendo coisas erradas]. Lembrando que era ordem de um presidente da República. [...] Então, eu estava... tanto que eu entrei em contato com a 'Veja' e relatei isso por medo".
Ele disse que o medo decorria do fato de saber que estava cometendo crime. E voltou a dizer que Bolsonaro teria garantido "indulto em uma eventual investigação, uma eventual denúncia, ou processo ou condenação".
A deputada Carla Zambelli (PL-SP) é investigada por contratar um hacker para atacar o Judiciário — Foto: Wagner Vilas/Enquadrar/Estadão Conteúdo
Delgatti voltou a dizer que partiu de Carla Zambelli o texto de um falso mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes.
O falso mandado foi inserido no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e descoberto em 5 de janeiro.
"Fui eu [o responsável por inserir o mandado falso no sistema]. A deputada me enviou um texto pronto, eu corrigi alguns erros e contextualizei, e publiquei a decisão. Ela me enviou [o texto], quem fez eu não sei", declarou.
Delgatti disse que orientou técnicos do Ministério da Defesa que elaboraram relatório oficial da pasta sobre as urnas eletrônicas. O documento, posteriormente, foi entregue ao TSE, em novembro de 2022.
O relatório não apontou qualquer fraude na votação, mas pediu que o TSE fizesse "ajustes" no sistema eleitoral já rejeitados tecnicamente por entidades fiscalizadoras e disse que não era possível atestar a "isenção" das urnas.
A posição do Ministério da Defesa, sugerindo dúvidas sobre a isenção das urnas, divergiu de todas as demais entidades fiscalizadoras nacionais e internacionais.
"Tudo isso que eu repassei a eles consta no relatório que foi entregue ao TSE. Eu posso dizer hoje que, de forma integral, aquele relatório tem exatamente o que eu disse, não tem nada menos e nada mais", afirmou o hacker.
Em bate-boca na CPI, Hacker diz que Moro é 'criminoso contumaz' e é chamado de 'bandido' pelo senador
Durante o depoimento, o hacker Walter Delgatti e o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) bateram boca. O hacker, que prestava depoimento, afirmou que Moro é "criminoso contumaz" e foi chamado pelo ex-juiz de "bandido".
Delgatti Neto ficou conhecido como o hacker da "Vaza Jato", em 2019, quando invadiu dispositivos eletrônicos e vazou mensagens atribuídas ao então ministro da Justiça e ex-juiz Sergio Moro, a integrantes da força-tarefa da Lava Jato e a outras autoridades.
O embate iniciou quando Moro citou condenação de Delgatti pelo crime de estelionato, relacionado a golpes que teriam sido cometidos em Araraquara (SP), e perguntou ao hacker quantas vítimas ele teria prejudicado. Delgatti respondeu:
"Relembrando que eu fui vítima de uma perseguição em Araraquara, inclusive, equiparada à perseguição que vossa excelência fez com o presidente Lula e integrantes do PT".
Na sequência, Delgatti disse que leu conversas do ex-juiz da Lava Jato em aplicativos de mensagem. "Li a parte privada e posso dizer que o senhor é um criminoso contumaz, cometeu diversas irregularidades e crimes".
Moro, então, pediu ao vice-presidente da CPI, senador Cid Gomes (PDT-CE), que exercia a presidência da comissão, que advertisse Delgatti, dizendo que o depoente não podia caluniar um senador na CPI.
"Bandido aqui, desculpe senhor Walter, que foi preso é o senhor. O senhor foi condenado. O senhor é inocente como o presidente Lula, então?", indagou o senador.
"O senhor não foi preso porque recorreu à prerrogativa de foro por função", retrucou o hacker.
Em nota, a defesa da deputada Carla Zambelli (PL-SP) "refuta e rechaça qualquer acusação de prática de condutas ilícitas e ou imorais pela parlamentar". E diz que não teve acesso aos autos da investigação.
"Suas versões [de Delgatti] mudam com os dias, suas distorções e invenções são recheadas de mentiras, bastando notar que a cada versão, ele modifica os fatos, o que é só mais um sintoma de que a sua palavra é totalmente despida de idoneidade e credibilidade", diz a defesa da deputada.
G1